“O objectivo da CIVICOP foi, desde o início, o de abraçar e apaziguar os espíritos das famílias vitimadas pelos conflitos políticos acontecidos desde 1975 até 2002, e quando possível encontrar as ossadas das vítimas e fazer-se um funeral condigno”, defendeu a fonte que falou em nome da organização.
Ademais, acrescentou que este princípio encontra acolhimento legal no Decreto Presidencial 209/20, de 4 de Agosto, assim como no pedido de desculpas públicas proferidas pelo Presidente da República, João Lourenço, quer para o caso do 27 de Maio de 1977, assim como para outros eventos chocantes que ocorreram no período pós-independência.
Segundo a fonte, as buscas de ossadas na Jamba é só mais um dos passos em direcção a este objectivo.
O membro da CIVICOP, que preferiu não ser identificado, desdramatizou os alaridos que se tem criado em torno dos trabalhos de identificação de possíveis ossadas de figuras ligadas à UNITA na localidade da Jamba, no município do Rivungo, província do Cuando Cubango, antigo bastião do Galo Negro durante a guerra civil.
“Este é um processo que continua. Hoje estamos na Jamba e amanhã estaremos noutro sítio”, disse, acrescentando que, além da sua agenda normal, a CIVICOP trabalha, também, em função das solicitações e pistas que recebe dos familiares das vítimas.
Por isso, continuou, “este é um processo muito sério e que deve ser abraçado por toda gente. Está assim desenhado desde o início, e nós iremos a todos os lugares aonde formos solicitados pelas famílias”.
A fonte que vimos citando lembrou que a ida à Jamba não teve motivações ocultas, ou para atacar adversários políticos, mas que resultou de solicitações de pessoas ligadas à UNITA que manifestaram a intenção de realizar um funeral condigno para os seus entes-queridos, a exemplo do que aconteceu com as vítimas do 27 de Maio.
“E a UNITA sabe disso, e qualquer tipo de alarido é intencional. Aliás, os objectivos estavam traçados, as pessoas acompanharam as reuniões e o que está a acontecer é apenas seguimento daquilo que estava traçado”, afirmou.
A fonte referiu que os membros que compõem a CIVICOP, incluindo os indicados pela UNITA, têm estado a participar activamante nas reuniões e conhecem a agenda de trabalhos da comissão.
“Portanto, se agora está-se a actuar, sem que se tenha antecipada alguma reunião, é apenas uma continuidade dos trabalhos e nada mais”, explicou, lembrando que aquando da localização das ossadas das vítimas do 27 de Maio também não foi necessário comunicar ao MPLA sobre o facto, pois constava da agenda de trabalhos da CIVICOP.
A fonte classificou as declarações de Adalberto Costa Júnior como “irresponsáveis”, que em nada abonam o princípio segundo o qual é necessário “abraçar e perdoar”.
Reiterou a importância deste processo, bem como o compromisso do Executivo em conferir às famílias o direito de enterrarem os seus entes e emitir as devidas certidões de óbito.
Por outro lado, explicou que o que se segue é a colheita do ADN das famílias que reclamam pelos seus entes-queridos, à semelhança do que aconteceu nos processos anteriores, e comparar-se com as ossadas já encontradas.
Finalmente, a fonte referiu que o mais importante é trabalhar para a construção de uma nação una e indivisível, e não criar mais situações que possam beliscar o processo e reabrir feridas.
Sociedade civil questiona supostos intervenientes ‘fora’ do processo
Para o director da Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD), Serra Bango, a introdução, na CIVICOP, dos Serviços de Inteligência e Segurança de Estado (SINSE) é um tanto quanto questionável, já que, no seu entender, estes serviços são férteis em adulteração de provas.
Aliás, Serra Bango questionou a legitimidade do director do SINSE, quando em entrevista à Televisão Pública de Angola (TPA), teria alegadamente referido que seria construído um memorial na localidade em que foram supostamente encontradas as ossadas do antigo general da FALA, Altino Sapalalo “Bock”.
“O general Miala é o porta-voz desta comissão, não do Governo”, disse, acrescentando que a divulgação deste tipo de informação é da inteira responsabilidade do Governo e não da CIVICOP.
Por seu turno, o coordenador da organização não governamental OMUNGA, João Malavindele, afirmou que as declarações do presidente da UNITA têm razão de ser e surgiram em momento oportuno.
O líder associativista garantiu que a organização que dirige tem a mesma apreciação, considerando que a CIVICOP está a ser utilizada para fins inconfessos.
“Achamos que o que está a acontecer é que se está a utilizar a CIVICOP para vitimizar uns em detrimento de outros”, disse, acrescentando que há um certo aproveitamento político da parte do partido governante.
João Malavindele alertou, por isso, para o retorno aos princípios fundantes da Comissão para a Implementação do Plano de Reconciliação em Memória das Vítimas dos Conflitos Políticos (CIVICOP), uma vez que quer o MPLA, como a UNITA, já terão pedido desculpas públicas ao povo angolano pelos eventos ocorridos no país.
PRS lamenta ter sido “excluído” do processo
Convidado a comentar o caso, o presidente do Partido de Renovação Social (PRS), Benedito Daniel, mostrou-se preocupado com o actual clima entre a CIVICOP e a UNITA, um cenário que, segundo o líder partidário, em nada abona o processo de reconciliação nacional.
Segundo o líder dos renovadores sociais, a ideia inicial, que previa a inclusão de todas as forças vivas da sociedade no processo, ficouse pelo caminho.
E, segundo Benedito Daniel, de um tempo a esta parte que a “CIVICOP foi confinada aos actores beligerantes”.
“E se a UNITA, por exemplo, entende que a CIVICOP está a ser utilizada para hostilizar os adversários políticos, nós ficamos sem entender, uma vez que ela é parte desta comissão.
Até porque o objectivo foi sempre criar-se uma organização conjunta para fazer face a este processo de reconciliação nacional”, disse Benedito Daniel.
A fazer fé nas acusações do líder do Galo Negro, Benedito Daniel questiona por que razão o Governo partiria para uma missão de localização de ossadas em determinada região do país sem que a UNITA fosse notificada?
“Eles são assim, mas quando as coisas começam a dar errado vêm novamente à procura dos outros”, disse em tom de ironia.
Todavia, explicou que as vítimas dos conflitos políticos não se encontram apenas em Luanda, pelo que era expectável que mais cedo ou mais tarde a CIVICOP virasse as suas baterias para as zonas outrora sob domínio da UNITA, como é o caso da Jamba.
Em resumo, o presidente do PRS mostrou-se satisfeito com o nível dos trabalhos que tem vindo a ser desenvolvido pela Comissão para a Implementação do Plano de Reconciliação em Memória das Vítimas dos Conflitos Políticos (CIVICOP), tendo apelado para uma conjugação de esforços para que as famílias vitimadas nos diversos conflitos políticos possam enterrar os seus entes e ultrapassar este capítulo. OPAIS