Numa entrevista concedida a cinco órgãos de informação, entre os quais quatro angolanos (Expansão, TV Zimbo, Jornal de Angola e o País) e à Agência Lusa, aos quais foi pedido o envio prévio de duas perguntas, João Lourenço falou detalhadamente do relacionamento Estado angolano com quatro empresas (Gemcorp, Omatapalo, Mitrelli, Leonor Carrinho) que têm sido apontadas como privilegiadas no acesso à contratação pública, apontando o papel financiador que têm tido.
O governante disse ainda que a maior parte das empreitadas de obras publicas, não estão nas mãos destas empresas e que quem tem a seu cargo a maioria das obras do Estado continuam a ser as empresas chinesas, quer em termos do número de empreitadas, quer do valor que representam, apontando exemplos como os da barragem de Caculo Cabaça (Cuanza Norte) Novo Aeroporto de Luanda ou Porto do Caio (Cabinda).
João Lourenço destacou que o país já teve empresas empreiteiras de vários países - brasileiras, portuguesas, chinesas, e em breve as turcas, e sublinhou que o executivo quer também maior participação de empresas angolanas privadas.
“Mas que não sejam privadas que vão buscar dinheiro à Sonangol, à Endiama, à Sodiam (empresas diamantíferas estatais), que não vão buscar dinheiro às empresas públicas”, ironizou, numa alusão aos processos judiciais em que estão implicados familiares e colaboradores próximos do antigo presidente e seu antecessor, José Eduardo dos Santos.
E rejeitou comparações com o que acontecia anteriormente, pois as empresas “que, no passado, eram protegidas” e concentravam os negócios do Estado “nunca financiaram o Estado em um tostão”.
“Antes pelo contrario, iam às empresas públicas, Sonangol, Endiama, Sodiam, até ao BNA (Banco Nacional de Angola) foram, buscar dinheiro do Estado em condições muito pouco claras, daí a razão dos processos que estão em curso”, reforçou.
Disse ainda que o Estado recebe propostas de financiamento de empresas de todo o mundo, muitas das quais não apresentam credibilidade ou têm condições gravosas, enquanto a Gemcorp (sediada em Londres) e a Mitrelli (de origem israelita) têm oferecido financiamentos vantajosos, que não usam o petróleo como colateral, obrigação que foi descontinuada no caso da Mitrelli.
A única exceção é a linha de financiamento que o Estado angolano mantém com a China, já que João Lourenço assumiu que não alcançou ainda o objetivo “de nos livrarmos do colateral petróleo”.
O chefe do executivo angolano concretizou projetos e financiamentos no caso dos quatro grupos que têm sido dados como privilegiados na sua relação com o Estado
No caso da Gemcorp disse que, de 2016 à data, financiou a economia angolana em 2,4 mil milhões de dólares, sobretudo na área de defesa e segurança, saúde e energia e águas, incluindo projetos de combate à seca, tendo também iniciado a construção de uma refinaria de petróleo em Cabinda.
“Este projeto que a Gemcorp está a executar é um projeto privado, não é um projeto público, o Estado angolano não vai pagar nada nos próximos anos à Gemcorp, esse projeto não constitui divida publica”, garantiu, acrescentando que a Sonangol (petrolífera estatal) ganhou 10% dessa refinaria sem encargos.
Sobre o grupo de Benguela, Leonor Carrinho, que “começou do nada” e foi crescendo ao longo dos anos, afirmou que o “Estado não pôs um tostão” na sua mais recente indústria de transformação de produtos alimentares, e que a empresa tem recorrido à banca comercial para se financiar.
O Presidente disse que o executivo está empenhado em reduzir a presença do Estado na economia que está demasiado “estatizada” e negociou uma linha de credito de mil milhões de euros com o Deutsche Bank para financiar exclusivamente o setor privado, sendo que apenas Leonor Carrinho “conseguiu provar que está habilitada a aceder a esta linha de crédito” e acrescentou que “é uma vergonha” que mais empresários não recorram a esta linha.
Quanto aos israelitas da Mitrelli assinalou que, entre 2012 e 2013, concederam uma facilidade de crédito de sete mil milhões de dólares ao Estado angolano, que foram usados para construir habitação (centralidades) e, mais recentemente, entre 2020 e 2021, financiaram 1,7 mil milhões de dólares para construir a sede da Comissão Nacional Eleitoral, hospitais, habitação, estádios de futebol e o Centro de Ciência e Tecnologia em Luanda.
Sobre a Omatapalo, considerou que se trata de “uma empresa nacional de grande dimensão” que “está à altura de realizar grandes empreitadas de obras públicas”, e que “Angola deveria ter quatro ou cinco Omatapalos”, cujas fontes de financiamento, “além das obras que faz, não são ilícitas até prova em contrário”.
Por isso, prosseguiu, “o Estado não pode prescindir de uma empresa como esta, não é para ser combatida, antes pelo contrário é para ser acarinhada, como todas as outras que pelo seu trabalho demonstrarem que merecem esse carinho”, disse, salientando que também a Omatapalo tem ajudado a financiar o Estado, iniciando obras “sem receber um tostão do Estado”.