Afonso Vita, que hoje lançou uma brochura do seu próximo livro sobre a “Rota Turística e Cultural de Escravos em Angola”, considerou que o Museu da Escravatura em Luanda não está à altura de dignificar e representar essa parte da História.
“Disse inicialmente que Angola é um dos países que mais homens, mulheres e crianças perdeu enquanto durou a história da escravatura, mas se olharmos para o museu [da Escravatura] que temos, não corresponde a essa dimensão e o projeto recomenda, como uma das metas até 2030, termos um museu à dimensão daquilo que foi a perda que tivemos em termos humanos”, referiu.
Segundo Afonso Vita, nos Estados Unidos da América foi criado um museu dos afrodescendentes, em Virgínia, que transmite a história dos negros naquele país, e Angola precisa, não necessariamente na mesma dimensão, de “criar algo que se aproxima àquilo e fazer algo que dignifique não só os angolanos que vivem deste lado, mas também os descendentes que estão noutros países do mundo”.
“Estamos a falar de uma perda de cerca de seis milhões de homens, é muita gente. Temos que ter aqui um museu que quem visitar sinta que Angola perdeu e que o nosso museu transmita isso aos nossos visitantes, é neste sentido que nós falamos sobre a dimensão daquilo que foi a história do tráfico de escravos”, sublinhou.
O projeto, que deverá iniciar a partir do próximo ano, prevê uma rota de dez dias por quatro localidades de Angola, nomeadamente o município do Soyo, província do Zaire, município de Ambriz, província do Bengo, comuna de Massangano, província do Cuanza Norte e Luanda, lugares onde o processo do tráfico de escravos decorreu.
Os locais escolhidos, segundo Afonso Vita, eram usados para a concentração, venda e embarque de escravos e o projeto pretende transformá-los em áreas de interesse para o turismo.
O investigador sublinhou que na investigação que realizou foram identificadas nove localidades do país ainda com vestígios da escravatura, mas por agora foram definidas apenas quatro para a visita.
O projeto inclui também a realização, durante dois dias, no próximo ano, do “Festival Internacional Bianual de Encontro e Reencontro da Africanidade em Angola” para “servir de chamariz” ao turismo, valorizar a cultura, a história, angolana, bem como estabelecer uma ponte entre Angola e a sua diáspora.
Questionado se há valorização e proteção deste património, o investigador disse que “neste momento estão a ser criadas as condições”.
“Não quero falar de valorização, porque ainda não sentimos esta valorização e um dos objetivos do projeto é a valorização da nossa identidade, chamar a atenção de que essa é a nossa história, que deve ser valorizada”, frisou.
Relativamente à proteção, Afonso Vita referiu que tem havido, por exemplo, na baixa de Luanda, na Rua dos Mercadores e outras áreas que faziam parte da passagem dos escravos.
“As casas que conhecemos na Rua dos Mercadores, que eram as casas onde eram aprisionados esses escravos hoje há áreas protegidas, que os carros já não podem passar para proteger o património”, indicou.
“Já há uma política de classificar e proteger esse património, agora queremos é dar vida a esse património. A cultura ou a história só tem valor quando entram receitas para poder dar sequência a essa valorização e o turismo tem essa vocação”, acrescentou.
A rota dos escravos foi o tema da tese de doutoramento de Afonso Vita, diretor-geral do Instituto de Fomento Turístico de Angola (Infortur), na Universidade de Coimbra.