Para Benja Satula, as ações feitas nos últimos cinco anos em relação ao combate à corrupção deveriam ter sido realizadas em 46 anos (período de Angola independente), mas, frisou, o país pode fazer mais nesse domínio, sobretudo com o novo Código Penal.
O novo Código Penal angolano, recordou o jurista angolano, estendeu a corrupção ao setor privado e “trouxe uma nova tipologia de corrupção, como o recebimento indevido de vantagem, cobrança de contribuições não devidas, tráfico de influência e participação económica em negócios”.
“Nós precisamos de deslocar então na sociedade o combate à corrupção do centro da administração pública, que o IGAE [Inspeção Geral da Administração do Estado] faz, também precisamos de isolar a ideia de que o combate à corrupção é uma missão da Procuradoria-Geral da República (PGR)”, afirmou Benja Satula.
Segundo o jurista, que falava hoje na conferência sobre “Integridade, Ética e Cibersegurança: Desafios e Oportunidades”, Angola “precisa de ressuscitar a Alta Autoridade contra a Corrupção, um ente que existe no ordenamento jurídico angolano, mas que nunca foi instituído”.
“O que se percebe é que nós temos uma inspeção que controla a administração do Estado, entretanto falta no centro de tudo uma Política Nacional de Combate à Corrupção, que não seja uma política judiciária levada pelo Ministério Público”, notou.
“Mas uma política administrativa, e até estadual, de combate à corrupção e a Alta Autoridade contra a Corrupção é uma dessas entidades que devemos ressuscitar ou criar uma entidade nova”, salientou.
“Justamente, porque mais do que criarmos leis, nós precisamos criar a perceção de que estamos a fazer um bom caminho e esta perceção falha”, assinalou.
O justista realçou: “Quando olhamos na forma como os negócios hoje são feitos, na forma como as privatizações são feitas, pela forma como as licenças são atribuídas ficamos com a sensação que falta alguma transparência”, realçou.
O combate à corrupção, à impunidade e ao nepotismo é uma prioridade afirmada pelo Presidente angolano, João Lourenço, no poder há quase cinco anos.
Benja Satula defendeu também que, “na ideia do delator ou das denúncias”, o país “precisa de encontrar uma entidade que não esteja diretamente vinculada à administração do Estado ou à Procuradoria-Geral da República para perceber o nível de corrupção incluindo na sociedade”.
“Acho que é um caminho que devemos fazer e a ideia de gabinetes de ética e integridade, porque é uma coisa que se discute bastante, e a proteção até institucional e profissional de promoção na carreira de quem faz a denúncia é importante”, apontou.
No entender do conhecido jurista angolano, Angola deve ter mecanismos para “salvaguardar a integridade, sobretudo para que agentes do Estado que venham denunciar a prática contra a corrupção de um ministro ou de um secretário de Estado não sofram represálias”.
“No fundo o que falta fazer é nós percebermos porque é que temos de discutir a integridade na forma de fazer e estar, porque se for só para que os outros possam ver então estamos num caminho errado”, atirou.
O também vice-reitor da Universidade Católica de Angola considerou igualmente que Angola tem ainda um “verdadeiro caminho a fazer” no domínio do controlo da gestão dos órgãos de soberania “porque são eles que decidem”.
Satula questionou o controlo das contas dos tribunais, da Assembleia Nacional (parlamento) e da Presidência da República, observando que “dificilmente” o inspetor geral da administração do Estado “terá competência para controlar as contas da Presidência da República porque é nomeado pelo Presidente da República”.
“Então, precisamos encontrar aqui mecanismos de controlo e de testes de integridade, até de proteção de conflitos de interesse, para que possamos de facto olhar para os nossos parceiros internacionais”, sustentou.
Aludindo à lei angolana sobre as entidades administrativas independentes, o jurista afirmou que Angola tem um “sério problema” de criar entidades independentes, como agências e órgãos de supervisão, mas estas “ainda se subordinam aos ministros”.
“De facto se dermos robustez às autoridades administrativas independentes, para com isenção e independência poderem regular o setor, nós desanuviamos um pouco a ideia do Estado”, sustentou.
Na ótica do jurista, “o ressuscitar da Alta Autoridade contra a Corrupção permite que no Estado, e não só no executivo, exista uma entidade a quem se possa fazer denúncias e as denúncias possam de facto ser levadas a cabo"
"Enquanto não tornarmos as instituições robustas nós vamos estar reféns das pessoas”, concluiu.
Benja Satula falava durante um painel sobre a “Integridade e Ética” nesta conferência promovida esta quinta-feira, em Luanda, pela Ernest Young (EY).