Celso Filipe / Jornal de Negocios
Será que João Lourenço se poderá manter na ribalta política angolana após terminar o mandato presidencial em 2027? A lei estipula que um chefe de Estado só pode cumprir dois mandatos consecutivos, pelo que João Lourenço estará impedido de se manter no palácio da Cidade Alta. Além disso, a falta de maioria qualificada do MPLA deita por terra qualquer possibilidade de rever a Constituição e de, por esta via, possibilitar que o atual presidente do país concorresse a um terceiro mandato.
Estas certezas poderiam indicar que a pergunta nos conduz a um beco sem fundo, e, neste sentido ser meramente retórica. Todavia, há um atalho neste beco que começa a ganhar lastro nos bastidores da política angolana. Trata-se de uma eventual candidatura de João Lourenço à vice-presidência (algo em que a legislação é omissa), sendo o lugar de número um do MPLA ocupado pela atual vice-presidente, Esperança Costa.
Aliás, de acordo com os promotores desta narrativa, não é por acaso que Lourenço escolheu uma mulher para número dois da lista. Correndo o risco de esta ser vista como uma interpretação misógina, a verdade é que o presidente da República angolana terá optado por uma mulher por esta ser, teoricamente, mais vulnerável e manipulável.
O fim da linha deste raciocínio, partindo do pressuposto que o MPLA ganha as eleições de 2027, é o seguinte: Esperança Costa, uns meses após ser eleita, abdicaria do cargo alegando motivos pessoais, subindo à chefia do Estado do país o seu número dois, isto é, João Lourenço, que durante este período manteria um poder efetivo relevante, resultante da sua condição de presidente do MPLA.
Os dois empecilhos
Existem duas circunstâncias que podem perturbar o funcionamento desta engrenagem. A primeira delas é uma vitória da UNITA nas eleições gerais de 2027, uma hipótese mais do que plausível, atendendo ao que se passou no ato eleitoral do ano passado, após o qual o partido do Galo Negro chegou mesmo a clamar a vitória.
O outro empecilho que se coloca nesta tática é o de João Lourenço ter de vir a enfrentar oposição interna no MPLA. O líder controla o partido mas não é de excluir que figuras carismáticas, como por exemplo António Pitra Neto, reflitam sobre a possibilidade de desafiarem Lourenço. Pitra Neto, refira-se, faz parte de uma “task force” criada pelo próprio Lourenço para estudar o melhoramento da organização, funcionamento e mobilização do MPLA, na sequência das eleições de 2022.
A letargia governativa e a sensação de que o ímpeto reformador de João Lourenço se parece ter esgotado no afastamento dos mais próximos de José Eduardo dos Santos, a par da corrupção agora visível no setor judicial e da falta de crescimento económico, são três fatores que alimentam a criação destes cenários.