No discurso de lançamento da agenda política do MPLA, sábado, o líder do partido e Presidente angolano, João Lourenço, focou os progressos alcançados pelo partido que está no poder desde a Independência, em 1975, afirmando que fizeram mais em 50 anos “do que o colono fez em 500 anos”.
Segundo João Lourenço, nos últimos 50 anos, foram construídas mais universidades, mais escolas e mais habitação.
"[Além disso], conseguimos oferecer melhor qualidade de água às nossas populações, mais energia, o que aqueles que nos colonizaram não conseguiram fazer. Ou, se fizeram, fizeram para eles, para os colonos, não para nós, os angolanos. Daí a razão da nossa luta. Daí a razão de termos pegado em armas para nos libertarmos e trabalharmos para o nosso próprio bem-estar”, sublinhou.
“O Presidente João Lourenço foi infeliz”, disse à Lusa o analista Albino Pakisi, salientando que os 500 anos de colonização foram diferentes dos 50 anos de governação do MPLA e que se há mais quantidade de projetos, muitos são “destratáveis”.
“Fizemos mais em termos de quantidade, construímos mais escolas, mais hospitais, mais estradas, mas não tem comparação com o que construíram os portugueses”, disse, apontando as escolas de referência que foram construídas no tempo colonial.
Para o professor universitário e comentador televisivo, os governantes angolanos não têm tido “capacidade e humildade de ver as condições reais das pessoas para poderem aferir o que estão a fazer”.
“Nós não tivemos no tempo colonial pessoas que comiam no lixo. Tem faltado um diagnóstico realista e como o Presidente da República não anda nos bairros não sabe a realidade do país. O MPLA deve sair da sua redoma para conseguir resolver os problemas dos angolanos”, disse o também filósofo.
Para Luís Jimbo, diretor executivo do Instituto Angolano de Sistemas Eleitorais e Democracia (IASED), a comparação não tem razão de ser e considerou que João Lourenço quis “sacudir a água do capote”.
“Comparar a exploração colonial com o período de soberania e de independência nacional não é comparável, porque o MPLA, no seu exercício de partido-Estado e de partido-governante, é soberano e tem legitimidade e acesso a plenos recursos territoriais, desde minerais, recursos humanos, a motivação e o interesse da exploração é o bem-estar do povo angolano”, salientou.
Por outro lado, a exploração colonial salvaguardava o bem-estar do colono e não do povo angolano, observou, considerando que o discurso de João Lourenço foi feito no sentido de “sacudir um pouco a água do capote, dizendo que tudo aquilo que o MPLA não conseguiu fazer nestes 50 anos, de um lado, tem a culpa da exploração e da violência colonial que vivemos e, por outro lado, teve a ver com os 27 anos de guerra civil”.
O académico Almeida Henriques tem outra opinião e considera que as referências de João Lourenço ao tempo colonial pretendem também chamar a atenção para algo “fundamental: a liberdade”.
“Não pode haver precipitações nas nossas avaliações, como se fosse algo incipiente, como se fosse um discurso que não tivesse algum propósito. É preciso olharmos esse discurso mediático e, se desconstruirmos o discurso, perceberemos que muitos dos aspetos que foram abordados era um estudo comparado entre o processo colonial e um processo de uma Angola independente”, disse.
O politólogo apontou ganhos no setor da formação, já que Portugal tinha “limitado a formação intelectual do cidadão angolano para o ensino superior”, realçando que os quadros de Angola independente não são os mesmos de quando o país ainda era província ultramarina de Portugal.
Para Almeida Henriques, o Presidente angolano terá querido também apresentar uma imagem “nacionalista” da sociedade política angolana.
“A imagem anterior não era nacionalista, a moeda não era angolana. E para onde iam as receitas do algodão, do café, e outros recursos da nossa agricultura? Eram receitas para Portugal, não para Angola”, enfatizou, afirmando que “os que antes reclamaram sobre a gestão colonial, se calhar são os mesmos que estão a duvidar deste discurso”.
O especialista disse ainda que “um cidadão que não é livre, não tem absolutamente nada, porque pode ter o pão de manhã, mas à tarde ele vai ser conduzido a um processo esclavagista”.