O velório público iniciou-se hoje, em Luanda, no Memorial Agostinho Neto, local fúnebre onde repousam os restos mortais do primeiro Presidente angolano, numa manhã cinzenta de cacimbo que tornou mais carregados os tons de luto no monumento.
Entre bandeiras negras a meia haste e cartazes debruados com faixas pretas, descrevendo “Zedu” como “um homem do povo” e “um bom patriota” “com o MPLA no coração”, estendia-se a longa passadeira vermelha que João Lourenço percorreu hoje, pontualmente às 10:00, até chegar à tenda preparada para as homenagens, onde abriu o livro de condolências.
Na sua mensagem, evocou o “momento de dor e consternação” em que “os angolanos choram o Presidente José Eduardo dos Santos”, destacando a sua entrega na defesa da independência e da soberania nacional “nos momentos mais críticos do país”.
“Vergamo-nos e honramos a sua memória, defendendo e perpetuando a sua maior obra, a paz e a reconciliação nacional”, acrescentou o chefe do executivo angolano, manifestando os “mais profundos sentimentos de pesar” à família enlutada.
Na tenda, onde flores e velas acesas rodeiam a foto do antigo chefe de Estado, podia ler-se uma biografia com as datas mais importantes da vida, cenário acompanhado com trecho musical solene a condizer com momento pesaroso.
Por ali passaram hoje grande parte dos membros do executivo e representantes dos órgãos de soberania e dos tribunais superiores, bem como alguns históricos pertencentes ao MPLA, partido que governa Angola desde a independência, em 1975, que fizeram fila para escrever a sua mensagem de despedida do ex-Presidente.
No entanto, não estiveram presentes membros da família, a maioria dos quais se encontra em Barcelona, com exceção do filho Filomeno dos Santos “Zenu”, que aguarda em liberdade a decisão sobre o recurso que interpôs após ter sido condenado a cinco anos prisão e que alegadamente não pode sair de Luanda por lhe ter sido retirado o passaporte.
O presidente da Assembleia Nacional, Fernando Dias dos Santos “Nandó”, segundo a assinar o livro de condolências, recordou entre os momentos marcantes com José Eduardo dos Santos a altura em que este o indicou como vice-ministro e comandante da Polícia.
“Teve o cuidado de me dizer: é uma pena indicarmos um jovem para estas importantes missões, mas alguém tem de as cumprir, nós estamos aqui para apoiar e ajudar. E ajudou e fizemos essa caminhada, até que conseguimos alcançar a paz e consolidar a unidade nacional”, salientou.
“Nandó” afirmou que se despede de José Eduardo dos Santos com um sentimento de “gratidão” e sublinhou o dever de honrar a sua memória “continuando a servir o bem deste povo”.
A Presidente do Tribunal Constitucional, Laurinda Cardoso, afirmou que José Eduardo dos Santos lhe deixou muitas recordações, de que deu nota no livro de condolências, lembrando a posição que este assumiu quando foi discutida a Lei da Toponímia, de que só se deveria homenagear o nome das pessoas depois de falecidas, em detrimento dos vivos.
“Foi uma das notas que me fez refletir”, disse aos jornalistas, visivelmente emocionada.
A presidente do Tribunal de Contas, Exalgina Gamboa, que foi secretária de Estado das Relações Exteriores de Eduardo dos Santos, salientou, por seu turno, “com muito orgulho”, que “os heróis não morrem”, descrevendo-o como “um grande estadista”.
“Ele ficará sempre na nossa memória. Choramos o passamento físico do camarada-presidente José Eduardo dos Santos, mas o legado que deixou é um legado glorioso, pelos seus feitos gloriosos, pela África e pelo povo”, elogiou.
O monumento será aberto a todos os cidadãos que quiserem prestar homenagem a José Eduardo dos Santos, a partir das 14:00, enquanto em Barcelona, a cidade espanhola onde morreu, decorrem negociações entre a família e o executivo sobre a realização do funeral.
O Governo angolano declarou que pretende fazer um funeral de Estado em Luanda, decisão a que se opõe uma das filhas mais velhas, Tchizé dos Santos, afirmando que essa não era a vontade do pai, e que José Eduardo dos Santos não queria ser sepultado em Angola enquanto João Lourenço estiver no poder.
Angola vai observar luto nacional por sete dias o que significa que nas instituições públicas as bandeiras estão colocadas a meia haste.
Estão igualmente proibidos eventos políticos, desportivos e culturais, o que obrigou já ao cancelamento dos comícios que os principais partidos angolanos tinham agendado para sábado, bem como adiamento de festivais, espetáculos musicais e encontros que estavam previstos para a próxima semana.