José Carlos, membro do Conselho Nacional da Ordem dos Advogados de Angola (OAA), considerou que a proposta de lei da amnistia, aprovada esta terça-feira em Conselho de Ministros, não se destina a facilitar saídas, mas abrange “todos aqueles indivíduos que tenham cometido crimes cuja penalidade seja inferior até dez anos” e que não se encontrem nas exceções previstas.
A proposta de lei, que segue agora para a Assembleia Nacional para discussão e aprovação, exclui, por exemplo, os crimes de vandalização, incitação à desordem pública e contra a segurança do Estado, os crimes de violação, os crimes de tráfico de drogas e de pessoas, os crimes de homicídio ou com uso de arma de fogo, os de peculato, corrupção e branqueamento de capitais, o auxílio à emigração ilegal e os crimes ambientais.
“Na lei que ainda está em vigor, os crimes amnistiáveis eram aqueles com penalidade até 12 anos. Neste momento o que nós vemos é que esta lei aperta um bocado mais, ela reduz um bocado mais o nível, o círculo, dos eventuais beneficiários”, referiu o advogado.
José Carlos aproveitou para esclarecer eventuais interpretações erradas sobre o crime de peculato, salientando que na lei vigente o mesmo era abrangido de forma implícita como um crime que não podia ser alvo de amnistia, “porque o peculato era punível até 16 anos e os crimes amnistiáveis são apenas aqueles com penalidades até 12 anos”.
“Hoje ele baixou, são crimes com penalidade até 10 anos, mas expressamente, e precisamente para evitar qualquer tipo de especulação e/ou dúvida, nas exceções, ou seja, nos crimes que não são amnistiáveis - e até porque hoje temos o peculato de uso, cuja penalidade é bastante branda -, ela já diz: o crime de peculato não é amnistiável”, observou.
Quanto à questão dos bens apreendidos a favor do Estado, José Carlos afirmou que “não é líquido que, uma vez apreendidos, estes bens revertam efetivamente a favor do Estado”.
José Carlos realça que o artigo 5.º da proposta de lei salvaguarda aqueles que, findo o processo-crime, devem ser restituídos a quem legitimamente os deva possuir ou os possa reclamar.
“Portanto, em meu entender, nada tem a ver com proteção de legalização de apreensões anárquicas ou ilegais, como queiramos chamar, não é o caso”, sublinhou.
Tchizé dos Santos, filha do ex-presidente angolano José Eduardo dos Santos, afirmou nas redes sociais que a “amnistia tem como objetivo legalizar os bens que foram entregues aos grupos Carrinho, Omatapalo, que foram retirados ilegalmente, sem uma justiça justa que desse veredictos justos”.
“O que esta gente quer é legalizar os bens a seu favor, através de uma amnistia (…) essa amnistia é para legalizar uma roubalheira do governo”, acusou a antiga deputada do MPLA (partido no poder), que, nas últimas eleições gerais, realizadas em agosto, apoiou o candidato da UNITA (principal partido da oposição angolana) contra o Presidente, João Lourenço.
Alguns filhos de José Eduardo dos Santos, em particular Tchizé dos Santos e Isabel dos Santos, empresária visada em vários processos judiciais em Angola e no estrangeiro, queixam-se de perseguição por parte do Presidente angolano, João Lourenço, e vivem fora de Angola há vários anos.
No final de outubro, o Presidente angolano transferiu para o Estado, por via de nacionalização, as participações da Vidatel e da Geni na operadora de telecomunicações angolana Unitel, que eram detidas pela empresária Isabel dos Santos e pelo general Leopoldino Fragoso do Nascimento, conhecido por “Dino”, do circulo próximo do antigo presidente, tornando o Estado angolano detentor do total do capital social da Unitel.
O ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Marcy Lopes, em declarações à imprensa, indicou que a proposta apresentada pelo governo visa amnistiar todos os crimes comuns com pena de prisão até dez anos, cometidos por cidadãos nacionais ou estrangeiros, com algumas exceções nas tipologias de crimes, no período entre 12 de novembro de 2015 e 11 de novembro de 2022.
O titular da pasta da Justiça e dos Direitos Humanos frisou que o diploma legal propõe igualmente para serem amnistiados os crimes militares puníveis com pena de prisão até dez anos, com exceção dos crimes doloso, cometidos com violência e dos quais tenha resultado a morte.
“É igualmente previsto um perdão genérico aos agentes dos crimes que não tenham sido abrangidos pela amnistia e este perdão vai na ordem de um quarto da pena que foi aplicada a estes cidadãos”, realçou.
Segundo Marcy Lopes, não são abrangidos na proposta os crimes dolosos cometidos com violência ou ameaça a pessoas, que resultou a morte ou quando tenha havido emprego de arma de fogo, isto é, crimes violentos.
A lista de crimes não abrangidos inclui também o tráfico de drogas de alto porte, o tráfico de pessoas ou tráfico sexual de pessoas, o tráfico de armas e de munições de guerra, os crimes sexuais com penetração, os crimes sexuais contra menores ou os que tenham sido praticados por meio de agressão sexual e os crimes de promoção e auxílio à imigração ilegal.
Os crimes de peculato, branqueamento de capitais, ambientais, os que resultam de vandalização, destruição ou a privação de bens públicos, contra a segurança do Estado, que não admitem liberdade condicional nos termos da lei, os de incitação à desordem pública, à sublevação popular e golpes de Estado e os crimes imprescritíveis nos termos da Constituição e da lei não são também amnistiados.
“De igual modo, não estão cobertos ou abrangidos por esta proposta de lei da amnistia os crimes patrimoniais, cujos danos não tenham sido reparados”, enumerou o ministro.
Marcy Lopes destacou que os bens que tenham sido apreendidos em processos-crime que são agora amnistiados são declarados perdidos a favor do Estado.
“A exceção é que, se estes bens forem titulados ou propriedade de um terceiro, estes bens não se perdem a favor do Estado e devem ser restituídos ao seu normal e comum titular”, clarificou.